quinta-feira, fevereiro 21, 2013

João de Barro

A correria de São Paulo mal deixa tempo para repararmos na cor do céu ou nas nuvens. Eu considero essa atividade como "um tempo para mim". Quando olho o céu, não penso em minha rotina ou em minhas obrigações. Penso na sensação de atravessar uma nuvem, como tudo fica pequeno lá do alto e na ideia de como seria nadar no ar, em queda livre. Meu cantinho para relaxar e esquecer do mundo é lá no alto, vendo como tudo é irrelevante quando comparado com a imensidão do céu.

Voltando pra casa, esperando meu ônibus, escuto duas senhoras conversando. O que me surpreende é o assunto. Nada de doenças, INSS ou netos. Elas estão falando sobre um passarinho que anda na calçada. Passarinho paulistano, anda a passos rápidos, precisos.

"Tadinho do bichinho. Difícil de ver um hoje em dia, né", diz a primeira senhora.

"É um João de barro" diz a segunda.

"O que ele tá fazendo?"

"Ele tá querendo água. João de barro adora andar na terra bem molinha".

Ah, calma lá. Como a senhora pode ter alguma ideia dos hábitos de um provável joão de barro?

"Perai q eu vou dar água pra ele". A segunda senhora se levanta e vai até o meio fio. Abre sua garrafinha de água e joga um pouco no chão e na parede, perto de uma árvore. Enquanto faz isso, ela diz: "Quando eu era pequena, tinha um monte desses onde a gente morava".

Ahh... Ok. Ela sabe que é um joão de barro. Mas eles não vão beber essa água suja...

O passarinho paulistano tinha olhado para a senhora durante todo o tempo em que ela jogou água no chão. Aos poucos foi se aproximando da pequena poça feita pela segunda senhora. Em poucos segundos, ele e um outro estavam bebendo a água da calçada.

Me pego olhando para os dois pássaros, menores que meus pés. Tão pequenos, tão bonitos, tão vivos. Até esqueço do meu ônibus.

"Quando a passarinha trai o joão de barro, ele fecha a casinha com ela dentro."

Tão pequeno, tão bonitinho e tão vingativo.

Chega meu ônibus. Subo. Quando eu crescer, quero ser como a segunda senhora e conversar sobre passarinhos.

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